quarta-feira, 26 de julho de 2006

muito além do inferno

Numa dessas noites arrastadas de tédio vi a cena mais delirante e demente. Antes disso, conto porque divagava dentro da noite veloz sem pudor nem asco, desfrutando do azedume impregnado nas calçadas do centro da cidade.
Ontem ainda cedo, saindo de casa fui atropelado e lançado do outro lado da calçada. Ainda zureta da porrada na orelha levantei e sacudi a poeira. Não contente, o motorista tascou spray de pimenta nos meus olhos. Óbvio, caí de maduro. É sério, vó, não faz essa cara de desconfiada. Durante um tempo não vi nada, só ouvi. Entre sirenes, tinha gente paranóica gritando: "Mata esse safado, deve ser ladrão"; outros complacentes, balbuciavam: "Ajuda o menino, chama a ambulância". E veio, zunindo.
Não me perguntaram nada. Arregaçaram a manga da minha camisa de flanela florida e cravaram a agulha na primeira veia que encontraram. Adormeci. Fui acordado com um tapa carinhoso que quase me derrubou da maca. A enfermeira, ranzinza, olhos esbugalhados e fumando, resmungou: "Te arranca, guri". Saí de mansinho e mancando.
Já passava das 16h. Morrendo de fome resolvi entrar na primeira biboca que apareceu. Bar do Lorival. Ambiente requintado, prato-feito por seis pila e compacto de Flamengo e Vasco na tevê. "Vai beber o que, patrão?". Qual é a ceva mais barata?, retruquei. "Só tenho das mais barata". Então, escolhe a mais gelada. Conversa vai, conversa vem. Acabei me estendendo. Saí do recinto depois da novela das nove.
Atravessando a Praça Dante Alighieri, presenciei a cena lírica e louca. Lembra da musa Anita Ekberg banhando-se na Fontana di Trevi, no filme La Dolce Vita, de Fellini? Pois bem. Troque os personagens e o cenário. No lugar da Anita coloque uma velha caquética rolando dentro do chafariz da Praça Dante. E o pior, assim que me viu, a coroca gritou: "Vem Mugnolini, vem".
E fui pra casa correndo rever Anita.

Conto de hoje publicado no jornal Pioneiro.

domingo, 23 de julho de 2006

curta 1

Quer aparecer de figurante no curta-metragem Quem é Tony? A primeira cena é a simulação de uma festa e será gravada dia 29, no Zarabatana Café.
A seleção do elenco está sendo feita essa semana. Ficou interessado? Liga aí: 9122.5230.

celebridades

Enquanto Esqueletóvski, o vocalista da Ligante Anfetamínico passeava com a sua herdeira, domingo a tarde, no Parque dos Macaquinhos, Fabrizzio, o vocalista da Cabaret Hitec aportava em Barcelona. Perdido nas ruelas de Barça, Fabrizzio não sabia onde dormir.

música de hoje

O Velho e o Moço
(Rodrigo Amarante)

Deixo tudo assim.
Não me importo em ver a idade em mim,
ouço o que convém. Eu gosto é do gasto.

Sei do incômodo e ela tem razão
quando vem dizer que eu preciso sim
de todo o cuidado.

E se eu fosse o primeiro a voltar
pra mudar o que eu fiz,
quem então agora eu seria?

Tanto faz que o que não foi não é.
Eu sei que ainda vou voltar... mas eu quem será?

Deixo tudo assim, não me acanho em ver
vaidade em mim. Eu digo o que condiz.
Eu gosto é do estrago.

Sei do escândalo e eles têm razão
quando vêm dizer que eu não sei medir
nem tempo e nem medo.

E se eu for o primeiro a prever e
poder desistir do que for dar errado?

Ah, ora, se não sou eu quem mais vai decidir o que é bom pra mim?
Dispenso a previsão!

Ah, se o que eu sou é também
o que eu escolhi ser aceito a condição.

Vou levando assim
que o acaso é amigo do meu coração
quando fala comigo, quando eu sei ouvir...