quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Só assim, divagar, sem nada buscar, nem desejar...



Tem dias que nada parece fazer sentido e justamente por isso me faz entender como nada é o que parece. Não uso drogas, acho um saco ter de manipular psicotrópicos pra sair do nada e encontrar lugar nenhum. Se é pra viajar eu prefiro a solidão. Uma estrada vazia, um disco estranho girando, girando no toca CD do carro, o sol se pondo, lentamente, e alguém pra chamar de "meu amor". O resto? O resto a gente compra no supermercado.

Há dias não escrevia nada. Absolutamente nada. Nada além de recados pra grudar na geladeira. Aí fui encarar a estrada. Bendita salvaguarda. Estrada guia. Não é o cheiro do asfalto, muito menos da combustão da gasolina que me provoca alucinações. Nem mesmo a Björk sussurrando ao pé do ouvido. É a travessia. Mesmo que de umn lado ao outro, rumando aparentemente sem destino eu chegasse na outra ponta da estrada do memso jeito. Quem sabe um pouco mais careca, afinal de contas o tempo é inexorável.

Mas a estrada exerce um fascínio sobre as pessoas. Mesmo quem despiste. Mesmo quem não reconheça essa estranha sensação de enfrentar a estrada. A cada travessia, por mais curta a distância, nos conduz para uma nova atmosfera. Parece papo de psicótico, eu te entendo, mas é um pouco além. Tipo, já fizeste uma viagem sem pressa, aproveitando todas as surpresas que a estrada oferece? Sem pressa é possível ver uma cabra comendo um pasto qualquer, sem importunar ninguém.

Sem pressa é possível aproveitar da paisagem. E sempre há um lugar mágico pra uma boa parada. Parada de deixar as portas do carro abertas, de ficar bem na margem de um vale silencioso, e talvez por isso mesmo tão mágico. Avistando um horizonte desses, que nem parece ficar à margem de uma rodovia movimentada, é possível entender porque tantos ajoelham-se todos os dias e oram pra agradecer a Deus a sua existência nessa vida. Porque à beira de um vale verde ou de um mar infinito aos olhos nossos tão pequenos, reconhecemos quanto inignificantes somos nesse mar de sonhos, amores, encantos e esperança.

Porque a morte nos encontrará, mais cedo ou mais tarde, seja num desfiladeiro, seja assistindo a tediosa programação de um canal qualquer da televisão. Mas muito antes dela nos encontrar é preciso dar tempo e espaço a vida. Vida atribulada, vida de supermercado, vida de afazeres domésticos, vida de cuidar dos filhos, vida de pagar IPTU, também. Mas é preciso dar espaço a uma outra vida, que é só nossa, que ninguém nos rouba, nem mesmo a quem mais amamos: nossa única e simples vida. Entender-se como indivíduo único e especial, que tem sua missão aqui nesse amontoado de terra é estar pronto para encarar-se ao espelho, sem medos nem cobranças.

Cabeça confusa é só uma rota de fuga. Mas se tiver de escolher uma fuga encare a estrada. Sem pressa de ir, muito menos de voltar. Se puder ser sem rumo melhor ainda. Aproveite o tempo, o silêncio da noite, a vaguidão da paisagem. Porque sentado na frente de um computador, com telefone tocando, com gente te chamando a todo instante, com contas pra pagar, com o carteirto batendo à sua porta, não dá. Não tem Cristo que se reconheça na sua intimidade se ao invés de viajar pra dentro de si mesmo Cristo tiver de a realidade disfarçada de cotidiano.

Permita-se viajar. Permita-se entender que nada, aboslutamente nada nessa vida vale mais do que o tempo a si mesmo. Seu amor vai lhe agradecer.