quarta-feira, 21 de junho de 2006

seu genaro se foi

Nunca entendi de onde vêm os sussurros das crianças adormecidas. Nunca entendi por quem choram. Jogadas na cama e entregues ao desconhecido, não sabem sequer se estão dormindo ou sobrevivem num estado letárgico, envolvidas num plasma de membrana invisível.

Há 10 anos não durmo. Não fecho os olhos sob condição nenhuma. Durante o dia, reviro gavetas, empilho bugigangas, varro o pátio, almoço com os pássaros. À noite, janto com os abutres, corro atrás dos gatos albinos, chuto garrafas no pátio. Alivio a ansiedade bebendo gim. Sempre puro, às vezes com gelo. Nem sempre uso copo, prefiro o gargalo.

Dona Alzira insiste. Não passa um só dia sem me lançar um olhar. Ela acredita no seu poder de sedução. Veste sempre um longo vestido florido e decotado. Só me sinto atraído pelos seios enormes e caídos, típicos de uma velha ama de leite. Alzira mora numa casa de madeira, verde e apodrecida pelo tempo. Nunca entrei por medo de não sair vivo. Pobre coitada, dizem ainda é virgem.

Entre uma piscada e outra, dentro da madrugada veloz, respiro. Prefiro a escuridão da noite, sem luzes, nem ruído. O silêncio acalma o turbilhão de desencontros neurais, entorpece a memória, afeta a lucidez do pensamento. Esculhamba. Causa dor e me faz gritar por piedade. RISOS.... Acho tudo isso tão engraçado. Porque assim que o sol se põe diante da janela da sala tudo passa. É como se eu sempre soubesse lidar com as falhas do meu inconsciente e a insanidade da consciência.

– Já pra jaula, Genaro.

E fui.

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