terça-feira, 21 de novembro de 2006

poemeto sem nome

o beijo do velho não tira o verme do ventre; não devolve a lucidez às baratas em redemoinho lambendo a ferida; não varre pra longe a faca banhada em sangue; nem mesmo se vestisse o manto cândido das beatas puras e trancafiadas pelo amargo sorriso de deboche; nada, nunca o amor; não silencia as hienas famintas; nem mesmo se parasse de beber cachaça de mel à sombra das castanheiras; numa das mãos um cetro de madeira retorcida, na outra, três chifres de alce; amor é blasfêmia; desejo, o coice do alce e a mordida da hiena; nem por isso, o velho deixa de lamber as feridas; caquético, alterna os velhos versos da ira de Atenas com o sorriso de deboche do coisa-ruim vendo Caim e Abel duelando na favela; se o porre de quase morte vale um a vida, o velho tem mais sete pra nascer; tragado pelo dilúvio, cospe a bílis, jorram da boca também os dentes; a gagueira é só um subterfúgio; ensandecido de amor e ódio, amamenta a prole com um ruidoso tapa na cara; era só um caroço debaixo do silicone; nada grave, não fosse a morte; o beijo do velho não devolve a vida ao ventre.


foto de Steven Pinker

Um comentário:

Anônimo disse...

Opa, vi sim.
Fico contente. Só tem que parar quando for imperativo o desencanto pela palavra ou pelas histórias. Tomara que não aconteça.